Há filmes que chegam para cumprir uma promessa e outros que chegam para a ultrapassar. Para mim, “Wicked: Pelo Bem” pertence claramente à segunda categoria. Se a primeira parte já me tinha deixado rendido ao universo renovado de Oz, este segundo capítulo agarrou-me pela emoção, pela grandiosidade e, sobretudo, pelo modo como celebra duas mulheres que, juntas, são pura força transformadora. Saí do cinema a pensar: “é por isto que adoro musicais”.



A luz, a sombra e tudo o que existe entre as duas

 

Cynthia Erivo e Ariana Grande são, sem exagero, um acontecimento. A química entre ambas é daquelas que não se força, sente-se. Erivo, com aquela presença intensa e uma voz que arrepia, dá a Elphaba uma dignidade que transcende a personagem; Ariana, por sua vez, surpreende ao encarnar uma Glinda que não é só brilho, mas também fragilidade, crescimento e coragem. Sempre que as duas partilham o ecrã, tudo o resto desaparece. E confesso: houve momentos musicais em que senti o coração a bater mais depressa, como quando um musical em grande escala atinge aquela nota emocional perfeita.

 

O filme é um regalo visual. Há cenários que parecem pinturas, figurinos que poderiam muito bem sair de um editorial de alta-costura, e uma direção artística que abraça o “teatral” de forma intencional, elegante e arrebatadora. Percebe-se que houve um cuidado extremo em manter o espírito do musical original, mas também em modernizá-lo, torná-lo mais acessível, mais cinematográfico, mais… mágico.

 

 

E depois há a mensagem, tão mais adulta do que muitos imaginam. A forma como se fala de poder, de verdade manipulada, de como a sociedade escolhe quem idolatra e quem demoniza, é surpreendentemente atual. Elphaba continua a ser o espelho de todos aqueles que nunca se encaixaram, e Glinda representa o conforto sedutor de ser sempre “a boa”, mesmo quando isso exige silêncio. Esta dualidade dá ao filme uma profundidade que não vi discutida o suficiente e que, para mim, é uma das suas grandes forças.

 

 

O impacto de um final que fica connosco

 

Tenho lido várias críticas que apontam falhas ou desequilíbrios, mas, honestamente, para mim isso quase não importa, ou melhor, importa menos do que a sensação que levei comigo. Sim, talvez o foco narrativo oscile mais para a Glinda, talvez certas passagens se estendam um pouco, mas nada disso me tirou do encantamento. Pelo contrário: senti que o filme me deu exatamente aquilo que precisava: emoção, espetáculo, entrega e um desfecho que honra tudo o que veio antes.

 


Quando os últimos acordes soaram, percebi que estava ali a assistir não só ao fim de uma história, mas ao culminar de uma amizade que marcou o cinema recente. Saí a pensar em como ambos os filmes falam sobre sermos vistos, compreendidos e, acima de tudo, sobre termos o direito de criar o nosso próprio destino. E isso, quando dito através de canções poderosas e duas protagonistas brilhantes, ganha um significado muito especial.

 


No fim de contas, “Wicked: Pelo Bem” não é apenas um musical exuberante; é uma celebração da diferença, da coragem e da escolha de fazer “o bem” mesmo quando o mundo tenta empurrar-nos para o contrário. É a magia de acreditar no impossível. E eu adorei, mesmo. É o tipo de filme que levo comigo, que volto a pensar dias depois, e que me lembra porque é que continuo apaixonado por cinema.

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Há histórias que me deixam sempre maravilhado pela forma improvável como o mundo decide funcionar. A do Guia Michelin é uma delas, e talvez a mais improvável de todas. É delicioso pensar que aquilo que hoje decide carreiras, transforma cidades e mexe com o ego de chefs no mundo inteiro nasceu de uma inquietação muito simples: ninguém conduzia. E, se ninguém conduzia, ninguém gastava pneus.

 

No ano de 1900, havia menos de três mil automóveis em toda a França. A Michelin, que hoje associamos a inovação e estrada, enfrentava um problema quase cómico: como vender algo que ninguém tinha necessidade de substituir? Como lembra um artigo recente da Vogue, os irmãos André e Édouard Michelin perceberam que era preciso “galvanizar os motoristas a desenvolverem as suas viagens e, assim, aumentar as vendas de pneus”. Em vez de esperar que o mercado crescesse sozinho, decidiram criá-lo.

 


O imprevisto que mudou tudo

 

E assim nasceu um pequeno guia vermelho oferecido gratuitamente, pensado para ajudar motoristas a aventurarem-se pelo país. Trazia mapas, oficinas, dicas práticas e, quase como um gesto secundário, sugestões de restaurantes. O objectivo era tão pragmático quanto engenhoso: fazer as pessoas viajar. Quanto mais quilómetros, mais desgaste; quanto mais desgaste, mais pneus; e quanto mais pneus, mais Michelin.

 

Acontece que o que mais cativou os leitores não foram as oficinas nem os postos de combustível. Foram os restaurantes. Era naquela pequena secção que as pessoas dobravam páginas, deixavam notas, faziam debates e procuravam inspiração para uma escapadinha. Era ali, sem os irmãos Michelin se aperceberem, que viria a nascer um novo mundo.

 

 

O nascimento das estrelas

 

Com o passar do tempo, a Michelin percebeu que a gastronomia era mais do que um mero complemento. Em 1926, introduziu as primeiras estrelas. A ideia não tinha nada de glamoroso: era uma simples orientação para viajantes. Uma estrela, valia a paragem; duas, justificava o desvio; três, merecia a viagem inteira. Ainda hoje acho genial a subtileza deste raciocínio: cada estrela era, na verdade, um convite à estrada, um incentivo directo ao consumo do próprio produto da marca.

 

A partir daí, o Guia Michelin deixou de ser apenas um serviço ao viajante para se transformar numa instituição cultural. A Vogue resume isso de forma perfeita ao dizer que “a palavra do guia é evangelho e as suas estrelas as distinções mais cobiçadas da restauração”. E é impossível negar. Um restaurante que recebe uma estrela muda de vida. Dois, eleva-se. Três, entra na eternidade. E a pressão, essa, é tão intensa quanto o brilho.

 

 

Também gosto da anedota que marcou o momento em que o guia deixou de ser gratuito. André Michelin visitou um dia uma oficina e encontrou exemplares a serem usados como calço para uma mesa. Indignado, disse a frase que mudaria tudo: “o homem só respeita aquilo por que paga”. No ano seguinte, o guia tornou-se pago e o respeito apareceu com ele. O que antes era um folheto prático transformou-se num símbolo de autoridade.

 

Com o tempo, o Guia Michelin criou carreiras, fortaleceu destinos, aumentou o turismo gastronómico e também colocou uma pressão enorme sobre quem vive entre tachos e panelas. Surgiram lendas, episódios de glória e até alguns de renúncia: chefs que devolveram estrelas para recuperarem a liberdade. E, no meio disto tudo, nasceram também os inspetores Michelin, figuras quase míticas que avaliam anonimamente, pagam as próprias refeições e vivem em sigilo. São os agentes secretos da gastronomia, silenciosos e invisíveis, mas determinantes.

 


A explosão global

 

Hoje, o Guia Michelin está presente em dezenas de países, adapta-se, expande-se, inclui street food, celebra sustentabilidade através das estrelas verdes e continua a reescrever a geografia da gastronomia. Onde chega, transforma. Onde atribui estrelas, ilumina. Onde passa, deixa, sem dúvida, um rasto de expectativa.

 

E, ainda assim, não consigo deixar de pensar na ironia original. Porque tudo, absolutamente tudo, começou com uma tentativa de vender pneus. Não é incrível? Um truque de marketing tornou-se a bíblia da gastronomia. Uma necessidade comercial deu origem a um dos maiores símbolos de excelência que existem. Da borracha ao ritual, da estrada ao prato, do pragmatismo ao prestígio.

 

É por isso que esta história me fascina tanto. Lembra-nos que as ideias têm caminhos próprios, muitas vezes mais ambiciosos do que imaginamos. E que a criatividade, especialmente quando nasce de um problema, pode transformar o mundo de forma inesperada.

 

 

Hoje, sempre que entro num restaurante estrelado, penso que estou, de certa forma, a participar na mesma história que começou há mais de um século, com um livrinho vermelho nas mãos de dois irmãos visionários que queriam apenas que conduzíssemos mais. E conduzir, sobretudo quando nos leva a uma boa mesa, continua a ser uma das grandes delícias da vida.

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Há filmes que chegam envolvidos em expectativas, outros em nostalgia, e depois há aqueles que, mesmo antes de os vermos, já carregam o peso de uma discussão maior. “The Running Man”, o remake realizado por Edgar Wright e protagonizado por Glen Powell, pertence claramente à terceira categoria. Não é apenas mais uma adaptação de Stephen King; é um espelho cintilante e desconfortável de tudo aquilo que consumimos hoje, quando o entretenimento se mistura perigosamente com a crueldade e a manipulação.

 

Antes de avançar para o novo filme, vale recordar que esta história já tinha passado pelo cinema em 1987, numa versão muito diferente, com Arnold Schwarzenegger a vestir a pele de Ben Richards. Era um produto típico dos anos 80, cheio de ação estilizada, vilões exagerados e aquele futurismo de neon tão característico da época. Não tinha a sofisticação deste remake, nem a profundidade do romance original, mas deixou a sua marca como um clássico de culto e, curiosamente, já lançava as primeiras pedras da crítica ao espetáculo televisivo e à manipulação mediática. É interessante perceber como aquilo que parecia exagero naquela altura soa hoje quase premonitório.

 


Feito este regresso rápido ao passado, voltemos ao presente. O “The Running Man” de 2025 é uma máquina visual, pulsante, saturada de cor e energia, construída ao milímetro para nos colocar dentro de um futuro onde a audiência manda, as corporações decidem quem vive e quem cai, e a dor humana é convertida em conteúdo televisivo. A estética é frenética, cheia de ecrãs, luzes e ritmos que não deixam quase respirar, e essa é precisamente a intenção. Wright quer que sintamos o peso do espetáculo. Quer que nos vejamos ali. E o resultado surpreende: visualmente poderoso, acelerado, saturado de energia, como se o próprio ecrã estivesse permanentemente a piscar-nos o olho. Um futuro onde a audiência manda, onde a dor é espetáculo e onde a verdade é, no mínimo, maleável. E a sensação que fica é justamente a de que estamos perante algo demasiado próximo da realidade para ser apenas ficção.

 

O Ben Richards de Glen Powell, que tem aqui um dos papeis mais completos da sua carreira, é um protagonista mais vulnerável e mais humano do que o da versão dos anos 80. Aqui, ele é um homem empurrado para o limite: perde o emprego, vê a filha doente, e aceita participar num reality show que transforma seres humanos em caça televisiva. Ou seja, acaba por ser arrastado para um jogo televisivo onde se torna caça num tabuleiro dominado por interesses corporativos. Powell, um herói relutante, moldado tanto pela necessidade, como pela consciência de que o jogo está viciado desde o início, brilha como nunca, alternando entre o humor, a tensão e uma inquietação muito real que puxa a história para um lugar mais emocional.

 

 

A crítica tem sido unânime em destacar a estética vibrante e o ritmo quase implacável que Wright imprime ao filme e não posso deixar de concordar. Todo o universo é construído com uma intenção clara: somos nós, hoje, levados ao extremo. A avalanche de informação, a sensação de que tudo está a ser filmado, editado, manipulado e servido fresco no feed seguinte. Há momentos em que a distopia se dissolve e o que fica é uma impressão inquietante de familiaridade. Ao olhar para aqueles cenários hiperdigitalizados, não pude evitar pensar na forma como, todos os dias, consumimos microversões desta lógica: a indignação, o escândalo, a humilhação, o ódio, a violência subtil, tudo embalado para gerar cliques.

 


Quando o espetáculo engole a verdade

 

Mas o filme não vive apenas das interpretações. A crítica social está lá, explícita, ácida, quase desconfortável: a manipulação da verdade, a fabricação de narrativas falsas, o consumo voraz de sofrimento como entretenimento: tudo é demasiado familiar para nos provocar apenas como ficção. Ao vermos aquelas multidões hipnotizadas por ecrãs e aqueles produtores a moldar a realidade como quem edita um vídeo de TikTok, temos a sensação de que Wright não está a imaginar um futuro… está apenas a ampliar o presente.

 

O lado menos conseguido talvez seja o final, que aposta mais no espetáculo do que numa reflexão mais íntima. Sente-se, por momentos, que o filme quer dizer demasiado, demasiado depressa, e com tanto fulgor que parte da mensagem se perde um pouco no ruído. Ainda assim, o impacto não se dilui. Continua a ser uma obra que provoca, que se instala no pensamento e que nos acompanha depois de sairmos da sala.

 


No conjunto, “The Running Man” é um filme que não deixa ninguém indiferente. Pode não ser perfeito, mas é certeiro. Faz pensar sem abdicar do ritmo, diverte enquanto provoca, e obriga-nos a encarar a forma como consumimos imagens, e como elas, muitas vezes, nos consomem de volta. Saí da sala com aquela sensação agridoce de quem sabe que viu algo atual, urgente e estranhamente próximo. E é por isso que o recomendo: não só como entretenimento, mas como uma reflexão embrulhada em ação e crítica mordaz. Talvez seja esse o verdadeiro mérito do filme: a capacidade de nos acompanhar para lá dos créditos finais.

 

Se gostam de cinema que nos faz olhar de lado para o nosso próprio mundo, então este vale claramente a ida ao cinema. Mesmo que seja apenas para perceber até que ponto estamos dispostos a ser espectadores... ou cúmplices.

 

Na antestreia do filme, com a minha amiga Cidália (NOS Colombo - Sala Imax)

 

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Há histórias que nos lembram, de forma quase poética, que a genialidade por vezes nasce de um gesto simples. Esta que vos vou contar, de Yuko Shimizu, a criadora de Hello Kitty, é uma delas. E confesso: tocou-me profundamente pelo simbolismo, pela persistência e pelo impacto invisível das pequenas ideias que teimam em não desaparecer.

 


A genialidade que nasceu de um desenho silencioso


Yuko Shimizu era uma jovem designer japonesa, nascida a 1 de Novembro de 1946, que trabalhava na Sanrio, uma pequena empresa especializada em produtos de papelaria e presentes, então ainda em fase de expansão. Durante as suas pausas para almoço, começou a desenhar uma gatinha sem boca, com um laço vermelho e um semblante sereno. Um desenho minimalista, quase infantil, nascido de um momento de quietude no meio da rotina.


O que Yuko não imaginava é que, apesar do carinho que colocava naquele pequeno esboço, a reacção inicial seria tudo menos encorajadora. Quando apresentou o projecto, os executivos da Sanrio não viram potencial. Disseram-lhe que era “simples demais”, que não tinha expressão, que resultava “básico demais” para gerar qualquer interesse comercial. A sua nova personagem foi rejeitada várias vezes. Em algumas narrativas, mencionam exactamente 47 vezes. Quarenta e sete, leram bem. E esta persistência é uma das faces mais belas da história.


E se a persistência era grande, a visão era maior. A maioria teria desistido muito antes, mas Yuko não. Continuou a acreditar na sua criação, no valor da simplicidade, na força silenciosa daquela gatinha. E foi essa fé tranquila que mudou tudo.



De ‘simples demais’ a fenómeno mundial


Em 1974, a Sanrio acabou por ceder. Lançaram Hello Kitty num pequeno porta-moedas transparente, quase como um teste tímido. O resultado? Esgotou imediatamente. Aquele lançamento experimental tornou-se o ponto de viragem. O que começou como um simples acessório transformou-se, pouco a pouco, num fenómeno cultural que conquistou o mundo. Hello Kitty evoluiu para brinquedos, roupas, linhas de beleza, colaborações de moda, aviões, restaurantes temáticos e até parques de diversões.


Atualmente, Hello Kitty é o ícone central de um império avaliado em mais de 80 mil milhões de dólares, ultrapassando franchises como Pokémon ou Star Wars em valor acumulado. Aparece em mais de 50 000 produtos distribuídos em mais de 130 países. O segredo, dizem alguns investigadores e especialistas, está na estética “kawaii” (ternura) e precisamente na escolha de Yuko: a personagem não tem boca. Porque assim, segundo a Sanrio, ela “fala pelo coração” e pode alargar-se a todas as culturas e idades, tornando-se universal. Essa ausência permite a cada pessoa projetar-lhe emoções próprias: “feliz”, “triste”, “sereno”, e isso cria uma ligação íntima com a personagem. E tendo Hello Kitty celebrado os seus 50 anos em novembro de 2024, vemos que não se trata apenas de nostalgia ou de merchandising. Trata-se de uma lição profunda sobre branding, design, persistência e cultura global.


E tudo isto a partir de um desenho que alguns executivos consideraram “simples demais”. O segredo, denotam, está na sua simplicidade intemporal: um design tão universal que transcende idade, idioma e cultura. Uma personagem que pode ser de todos e para todos.

 


 O valor das pequenas ideias: o legado de Yuko Shimizu

Yuko Shimizu reformou-se nos anos 80, mas o seu legado vive em cada produto, cada parceria, cada sorriso provocado por Hello Kitty. E vive, acima de tudo, na mensagem poderosa que deixa ao mundo: a rejeição não é o fim. É apenas o filtro que nos obriga a persistir e que separa quem sonha de quem constrói.


No fundo, a história de Hello Kitty lembra-nos que aquilo que hoje possa parecer “pequeno demais” pode, amanhã, tornar-se absolutamente inesquecível. Basta acreditar. Tal como Yuko acreditou.


E agora, quando celebra um pouco mais de meio século de existência, Hello Kitty continua a provar ao mundo o poder subtil, mas profundamente transformador, da ternura. No fundo, lembra-nos que as ideias mais simples podem atravessar gerações, unir culturas e inspirar vidas. Que esta história seja um lembrete de que nunca é tarde para acreditar no que criamos, nem para dar voz ao que nasce do nosso âmago. Porque, às vezes, basta um pequeno gesto para impactar o mundo inteiro.

 


 

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Colleen Hoover regressa ao grande ecrã com um drama sobre perdas, segredos e recomeços... Baseado no livro “Regretting You”, desta autora, o filme “Sempre Tu” chega aos cinemas para explorar um dos temas mais delicados da vida: o reencontro entre mãe e filha depois de uma tragédia. Realizado por Josh Boone, o mesmo de “A Culpa é das Estrelas”, e contando com Allison Williams, Mckenna Grace e Dave Franco nos principais papéis, este drama romântico tenta equilibrar luto, perdão e amor com uma leveza que o torna, ao mesmo tempo, familiar e comovente.



E aqui vos venho falar deste filme, a que tive o privilégio de assistir à sua antestreia. A história centra-se em Morgan Grant (Allison Williams) e na filha Clara (Mckenna Grace), que vêem as suas vidas viradas do avesso após um acidente devastador que tira a vida ao marido de Morgan, Chris (Scott Eastwood), e à sua irmã Jenny (Willa Fitzgerald), tia e confidente de Clara. A partir desse momento, mãe e filha são obrigadas a enfrentar o vazio, as mágoas antigas e segredos há muito guardados, num processo doloroso, mas inevitável de reconciliação.

 

O argumento, assinado por Susan McMartin, adapta com fidelidade o romance de Hoover, que se tornou um fenómeno global. E talvez por isso, o filme parta já com uma carga emocional elevada, sobretudo para os leitores que se deixaram tocar pela escrita crua e íntima da autora. Colleen Hoover, que aqui assume também o papel de produtora executiva, confessou que se emocionou ao ver a primeira montagem: “Aquela cena era tão fiel ao livro que percebi logo que respeitaram a minha visão.”




Mas, como em quase todas as adaptações literárias, há perdas. Boone e o elenco esforçam-se para manter a densidade emocional do texto, mas “Sempre Tu” parece por vezes demasiado contido, como se tivesse medo de mergulhar verdadeiramente na dor. O luto surge mais como pano de fundo do que como força motriz. E é pena, porque o filme tinha matéria-prima para algo maior. Poderia ser um pouco mais intenso, mas tal como é, não deixa de nos emocionar...

 

Ainda assim, há momentos em que o filme encontra o seu tom. Boone volta a mostrar o cuidado em retratar o quotidiano com ternura: os gestos simples, os silêncios, o desconforto entre mãe e filha, e a fotografia delicada e a banda sonora intimista ajudam a criar esse ambiente de reconciliação. Mckenna Grace é o coração da narrativa: natural, carismática, convincente. Allison Williams mantém o equilíbrio entre fragilidade e força, e Dave Franco, mais contido, funciona como o contraponto emocional de Morgan, sem nunca lhe roubar o foco.

 


Franco, aliás, tem um motivo extra para ver o filme ganhar destaque em Portugal: o actor revelou, recentemente, numa entrevista, o seu orgulho pelas raízes madeirenses, herdadas do avô paterno, e deixou no ar a promessa de visitar o nosso país em breve. Tal não deixa de ser uma ligação curiosa e simbólica, já que “Sempre Tu” é também um filme sobre raízes, as que nos prendem e as que nos permitem recomeçar.

 

No fundo, esta é uma história sobre perdas que se transformam em pontes, sobre feridas que aprendem a cicatrizar e sobre relações que renascem da fragilidade. Boone evita o melodrama fácil e aposta numa condução sincera, próxima, quase doméstica. Mesmo quando o guião acelera ou se rende a clichés, e há alguns, a emoção consegue resistir.

 


“Sempre Tu” não é um filme perfeito, mas é um filme honesto. Fala sobre amor e arrependimento, sobre crescer e perdoar, e sobre a coragem de reconstruir o que parecia perdido. Como a própria Colleen Hoover costuma lembrar, “a vida é por vezes triste, tal como as nossas histórias, mas é no meio dessa tristeza que encontramos os momentos de verdadeira alegria.”

 

No fim, fica a sensação de que, apesar das suas fragilidades, “Sempre Tu” tem o "coração" no sítio certo. E talvez seja isso o que mais importa: lembrar-nos de que o amor, mesmo imperfeito, é sempre um ponto de partida e de regresso. E às vezes, são as histórias mais simples aquelas que nos "tocam" mais...

 


 

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Nesta madrugada de sábado, 26 de outubro, para domingo, 27, os relógios vão recuar uma hora. Em teoria, ganhamos 60 minutos de sono; na prática, nem sempre o corpo agradece. Esta mudança pode interferir com o nosso descanso, apetite e até humor, sobretudo em crianças e pessoas mais velhas, mais sensíveis a alterações de rotina.

 

A verdade é que dormir bem não se resume ao momento em que nos deitamos, mas começa muito antes, nas pequenas decisões que tomamos ao longo do dia e, sobretudo, nas horas que antecedem o sono. O segredo está em respeitar a química natural do corpo.

 

Durante o dia, o cortisol mantém-nos ativos e atentos; à medida que anoitece, os seus níveis devem baixar para que a melatonina, a hormona do sono, possa fazer o seu trabalho. Quando esse equilíbrio é perturbado, por luzes fortes, ecrãs ou refeições tardias, o organismo perde o ritmo e o descanso torna-se menos reparador.

 


 

Como ajudar o corpo a ajustar-se à mudança horária

 

1. Façam uma adaptação gradual

O corpo é um ser de hábitos. Se passamos a dormir ou acordar uma hora diferente do habitual, ele ressente-se. Ajustar a rotina de forma progressiva, de 5 a 10 minutos por dia, ajuda a retomar o equilíbrio natural sem grandes sobressaltos.

 

2. Atenção ao jantar (e à hora em que o fazem)

Evitem excitantes como café, chá, chocolate e alimentos que se transformam rapidamente em açúcar (pão, massa, arroz, doces). O ideal é jantar de forma leve e com antecedência, cerca de três horas antes de se deitarem. Digestões pesadas atrasam a libertação da melatonina e dificultam o sono.

 

3. Reduzam luzes e ecrãs

A luz azul dos dispositivos eletrónicos inibe a produção da hormona do sono. Por isso, baixem a iluminação e evitem telemóveis, televisão e tablets pelo menos uma hora antes de ir para a cama.

 

4. Evitem estímulos mentais antes de dormir

Nem só a alimentação interfere no descanso. Ver uma série intensa, um filme de ação ou praticar exercício físico à noite também eleva os níveis de cortisol. Antes de dormir, optem por atividades relaxantes: ler, ouvir música suave ou tomar um duche morno podem ser excelentes aliados.

 

5. Procurem luz natural logo de manhã

A exposição solar ao acordar ajuda o relógio biológico a reajustar-se e melhora os níveis de energia durante o dia. A luz natural é o despertador mais poderoso e eficaz que temos.

 

6. Mantenham rotinas estáveis

Deitar e levantar à mesma hora, mesmo ao fim de semana, reforça o equilíbrio hormonal e melhora a qualidade do sono. A regularidade é meio caminho andado para um descanso profundo e restaurador.

 

 

Mudança necessária ou hábito ultrapassado?

 

Todos os anos, com o relógio a mudar, regressa o mesmo debate: faz ainda sentido manter esta alteração? A Comissão Europeia já discutiu várias vezes a hipótese de abolir o ajuste bianual, unificando horários. O impacto no organismo é real: em alguns locais, o amanhecer chega depois das oito da manhã no inverno e o pôr do sol acontece antes das seis da tarde, reduzindo a exposição natural à luz e afetando a produção de melatonina.

 

Além disso, há exemplos de países que já deixaram de praticar a mudança da hora ou que nunca a adoptaram. Da Rússia ao Japão, passando pela China, onde se concluiu que o sistema sem ajustes facilita a saúde e a segurança da população. E quando se altera o ciclo claro/escuro natural, estamos a mexer com os nossos ritmos circadianos, esse relógio interno que dita o sono, a vigília, o metabolismo e até as emoções.

 

A verdade é que, mais do que o relógio externo, o corpo pede consistência. Dormir bem é uma questão de química, constância e harmonia. Quando lhe damos tempo e sinais claros, o corpo sabe exatamente o que fazer. O regresso à hora legal (ou horário de verão) acontece a 29 de março de 2026.

 


 

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Há objetos que atravessam o tempo e se tornam mais do que simples produtos, transformam-se em memórias, em símbolos de afeto e em pequenos rituais que acompanham gerações. A lata azul da Nivea é, sem dúvida, um desses ícones universais. Concordam comigo? E agora, em 2025, essa latinha azul sopra 100 velas e reafirma o seu estatuto como um dos maiores clássicos da história da cosmética.


Para muitos de nós, a marca também faz parte das memórias mais felizes do verão: o cheiro do protetor solar, o azul intenso das bolas no mar ou, em formato gigante, a servirem de ponto de encontro, e aquele brilho inconfundível da lata de creme que tantas vezes víamos em casa dos pais ou dos avós. Por isso, ao saber que a Nivea celebra este ano o centenário da sua mítica lata azul, não resisti a dedicar-lhe este artigo. Afinal, esta é também uma história de afetos, de herança e de continuidade. Valores que atravessam gerações e que, de alguma forma, também me tocam. (Lembram-se da bola Nivea? Escrevi sobre ela há uns anos neste artigo do meu blog.

 


Um ícone que nasceu do cuidado

Em 1925, a Nivea trocou a embalagem amarela original do seu creme hidratante por uma lata azul-escura com letras brancas. À primeira vista, tratou-se de uma mudança simples; na verdade, foi um marco de design e identidade.

Inspirada nas cores do céu e do mar, a nova embalagem transmitia pureza e serenidade, valores que se tornariam inseparáveis da marca. O design, liderado por Juan Gregorio Clausen, rompeu com o estilo decorativo da época e apostou numa estética limpa e intemporal, uma aposta que ainda hoje define a Nivea. Um século depois, essa mesma fórmula visual continua a transmitir confiança, proximidade e autenticidade, valores que sustentam a marca até hoje.


De Hamburgo para o mundo

Produzida na cidade alemã de Hamburgo, onde a Nivea nasceu, a icónica lata azul viaja para dezenas de países, levando consigo o mesmo creme que, há décadas, hidrata, protege e conforta. Em 2024, venderam-se mais de quatro latas por segundo, um feito que a consagra como o produto de cuidado da pele mais vendido no mundo.

 

 

Mas mais do que números, é a relação emocional que importa. Quantos de nós não crescemos a ver uma lata azul na casa dos pais ou dos avós? Quantos momentos de infância não têm o seu aroma e a sua textura como pano de fundo? É essa continuidade afetiva que transforma a Nivea numa marca que cuida não apenas da pele, mas também das lembranças.

 


Tradição e modernidade de mãos dadas

Como recorda José Luis Ramallo, Country Commercial Manager da Beiersdorf Portugal, a Nivea conseguiu preservar a identidade da sua lata azul através de “uma combinação entre consistência e evolução”. Mantém os elementos-chave, a cor profunda, a forma redonda, a tipografia branca, mas adapta-se às novas linguagens e hábitos de consumo, nomeadamente com uma presença mais próxima e digital.

A marca sabe que tradição e inovação não se opõem: complementam-se. E é precisamente essa harmonia que a mantém relevante, geração após geração.

 


Um futuro mais sustentável

O século XXI trouxe novos desafios, entre eles, o da sustentabilidade. Hoje, cada lata é fabricada com, pelo menos, 80% de alumínio reciclado, numa produção inteiramente realizada em Hamburgo, com processos otimizados para reduzir a pegada de carbono.

Este avanço ilustra o propósito da marca: cuidar não só da pele, mas também do planeta. Afinal, como a própria defende, “o verdadeiro cuidado vai além da pele, é também o cuidado com as pessoas e com o mundo que partilhamos.”

 

 

Diversidade, inclusão e novas expressões de cuidado

Ao longo do tempo, a icónica lata azul também se tem reinventado, refletindo as transformações sociais e culturais do mundo que a rodeia. Em 2024, a Nivea lançou uma edição especial com as cores do arco-íris, em homenagem ao Pride Month e ao movimento LGBTQIA+. Sob o conceito “Be You”, esta versão simboliza o compromisso da marca com a inclusão, a diversidade e a autenticidade, lembrando-nos que cuidar da pele é também uma forma de celebrar quem somos.

 

Mas a história da lata azul não se fica por aqui. Com o lançamento do Nivea Men Creme, a marca mostrou que o cuidado não tem género, é universal. A lata, agora em azul-escuro com design mais sóbrio e contemporâneo, tornou-se um aliado essencial nas rotinas masculinas, reforçando a ideia de que o autocuidado é um gesto de força e de bem-estar. Portanto, de arco-íris vibrante a elegância minimalista, a lata azul prova que continua a acompanhar o seu tempo, sempre fiel ao mesmo propósito: cuidar, incluir e inspirar.

 

Um ícone eterno

Cem anos depois, a lata azul continua a ser um símbolo de confiança, amor familiar e autocuidado. Um pequeno objeto que cabe na palma da mão, mas que guarda dentro de si um século de histórias.

 

Talvez seja essa a verdadeira magia da latinha da Nivea: a de permanecer próxima, tocando cada geração com o mesmo gesto, o de cuidar da pele, mas também, de alguma forma, do coração.



 

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